Um dia desses, ao entrar na sala da
coordenação da escola, uma mãe, que estava sendo atendida pela coordenadora,
olhou para mim, perguntou se eu era professora, admirada, e soltou um triste e
compassivo: "Coitaaada...!"
Eu poderia ter questionado, respondido,
dito mil coisas, mas fui discreta. Eu só queria saber se poderia levar meus
aluninhos do 1ºM04 para o pátio, então apenas saí rapidamente, rindo por dentro
da situação.
Eu sei o que diz o senso comum sobre
ser professor neste país, por isso, até entendo o "coitada"
emocionado daquela senhorinha, mas se tivesse um jeito gentil e simpático de
fazer, eu gostaria de poder demonstrar que no meu caso, não é beeem assim.
Em primeiro lugar, quando eu escolhi
ser professora, eu conhecia o senso comum e eu sabia como era escola, ninguém
me iludiu. De fato, há dias difíceis, como em qualquer trabalho, mas na maioria
deles - 95% - dá para fazer funcionar com "ingredientes" muito
simples: paciência, amor, maturidade e interesse honesto em contribuir como
educador para a sociedade, sem preguiça!
Houve um tempo em que professor gostava
de sermão, de dar conselho, falar do futuro, de intimidar com possibilidades
chocantes, "impor" respeito etc etc... Pra dar aula e conseguir que
os alunos produzissem tinha que ameaçar tirar nota...! Muita gente até faz isso
ainda, mas se frustra porque se um um dia adiantou, hoje não funciona mais.
Na minha experiência como professora,
cometi alguns erros imbecis no início, tentando constituir minha autoridade por
meio da aspereza, por exemplo, ou ainda, ensinando como se os alunos fossem se
tornar experts nos conteúdos da minha disciplina, agindo como se adolescentes
pudessem agir com uma maturidade muito superior a que eu deveria esperar... Não
digo que não erro mais. É claro que ainda tenho muito a aprender! Mas nesses
poucos anos, as coisas já mudaram tanto dentro da minha cabeça e na minha
prática pedagógica que a cada dia me sinto mais feliz e mais realizada pela
minha opção de ser professora, não porque me sinta uma heroína, cheia dos
melhores resultados, nada disso! A minha compreensão daquilo que é realmente
essencial é que mudou, o meu olhar sobre o outro foi que mudou.
Há alguns meses um colega da época da
faculdade, até me perguntou se eu já havia me tornado uma profissional
medíocre, dessas que empurra pela barriga, que acha que não tem jeito, mas
continua trabalhando e reclamando todos os anos das mesmas coisas, do mesmo
jeito... Isso não aconteceu comigo, pelo menos não ainda. Eu amo a minha escola,
amo estar com meus alunos, eles me fazem bem e eu sinto que faço o mesmo a
eles, antes de tudo como ser humano, e a partir daí, do estabelecimento dessa
boa relação, da cooperação entre professor e aluno, é possível produzir
resultados efetivos no processo ensino-aprendizagem. Antes de tudo aprendemos
com o exemplo, com a prática e daí a fala, a teoria, passa a ter sentido.
É muito simples: se eu quero que meus
alunos me deem "bom dia!", lindamente, pela manhã, preciso ser a
portadora desse lindo bom dia que eu espero. Se eu quero que sejam gentis
comigo, preciso ser a primeira a mostrar como é. Se eu quero que se dediquem
com as atividades, trabalhos etc... Preciso ser dedicada como professora,
preciso ao menos tentar pensar naquilo que eu posso fazer de agradável nos meus
planejamentos, para esperar uma resposta proporcionalmente feliz! Se eu fizer
tudo que puder na minha vida usando Ctrl+C Ctrl+V, estou longe de ser um
exemplo pra qualquer criança ou adolescente que está na escola, muito pelo contrário,
sou mais um corrupto que provavelmente reclama da corrupção do país, estando
cego para o erro que está em mim mesmo.
Uma das maiores lições que aprendi na
escola pública, é que se você não gosta de gente, se não está aberto a
reconhecer e valorizar os outros, o que eles sabem e são, independente de
qualquer coisa, antes de buscar isso para si mesmo, esse não é um lugar para
você. A escola pública é um lugar de gente que entende de humildade e respeito,
que não se deixa levar por pré-conceitos, mas que está aberto ao diálogo, à
interação e à empatia. Escola não é lugar de gente preguiçoso, acomodado, que
não se preocupa em identificar-se com o outro, conhecê-lo, percebê-lo,
entendendo as modificações sociais. Para promover transformação e provocar efeitos
duradouros, a escola precisa de gente disposta a buscar alternativas de
encantar sua clientela e provocar a vontade de se esforçar um pouquinho mais,
aprender um pouquinho mais...
Sem relacionamento, sem cooperação, sem
bom humor, não há aprendizagem que ultrapasse as folhinhas de provas... A
aprendizagem que marca para a vida, precisa ser provocada por mais do que
"conteúdos curriculares difíceis" que ninguém vai usar depois da
escola, a aprendizagem que marca para a vida tem a formação crítico-cidadã em
primeiro lugar, tem a promoção da habilidade de ler e produzir sentido para a
vida, para aquilo que é real e diário como prioridade, tem a escrita como arma
social para a promoção de um futuro acadêmico, profissional e cidadão de
qualidade.
Não sei se todas as minhas reflexões
fazem sentido para outros docentes, mas sei que é o que tem dado certo para
mim. Apesar dos resultados da minha escola não serem os melhores, devagarzinho,
consigo ver pequenas vitórias como fruto de um trabalho assim, que compensam e
me motivam a continuar batalhando, pensando e planejando caminhos para
aperfeiçoamento da minha realidade escolar.