quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Sobre ser professora e amar isso



Um dia desses, ao entrar na sala da coordenação da escola, uma mãe, que estava sendo atendida pela coordenadora, olhou para mim, perguntou se eu era professora, admirada, e soltou um triste e compassivo: "Coitaaada...!"
Eu poderia ter questionado, respondido, dito mil coisas, mas fui discreta. Eu só queria saber se poderia levar meus aluninhos do 1ºM04 para o pátio, então apenas saí rapidamente, rindo por dentro da situação.
Eu sei o que diz o senso comum sobre ser professor neste país, por isso, até entendo o "coitada" emocionado daquela senhorinha, mas se tivesse um jeito gentil e simpático de fazer, eu gostaria de poder demonstrar que no meu caso, não é beeem assim.
Em primeiro lugar, quando eu escolhi ser professora, eu conhecia o senso comum e eu sabia como era escola, ninguém me iludiu. De fato, há dias difíceis, como em qualquer trabalho, mas na maioria deles - 95% - dá para fazer funcionar com "ingredientes" muito simples: paciência, amor, maturidade e interesse honesto em contribuir como educador para a sociedade, sem preguiça!
Houve um tempo em que professor gostava de sermão, de dar conselho, falar do futuro, de intimidar com possibilidades chocantes, "impor" respeito etc etc... Pra dar aula e conseguir que os alunos produzissem tinha que ameaçar tirar nota...! Muita gente até faz isso ainda, mas se frustra porque se um um dia adiantou, hoje não funciona mais.
Na minha experiência como professora, cometi alguns erros imbecis no início, tentando constituir minha autoridade por meio da aspereza, por exemplo, ou ainda, ensinando como se os alunos fossem se tornar experts nos conteúdos da minha disciplina, agindo como se adolescentes pudessem agir com uma maturidade muito superior a que eu deveria esperar... Não digo que não erro mais. É claro que ainda tenho muito a aprender! Mas nesses poucos anos, as coisas já mudaram tanto dentro da minha cabeça e na minha prática pedagógica que a cada dia me sinto mais feliz e mais realizada pela minha opção de ser professora, não porque me sinta uma heroína, cheia dos melhores resultados, nada disso! A minha compreensão daquilo que é realmente essencial é que mudou, o meu olhar sobre o outro foi que mudou.
Há alguns meses um colega da época da faculdade, até me perguntou se eu já havia me tornado uma profissional medíocre, dessas que empurra pela barriga, que acha que não tem jeito, mas continua trabalhando e reclamando todos os anos das mesmas coisas, do mesmo jeito... Isso não aconteceu comigo, pelo menos não ainda. Eu amo a minha escola, amo estar com meus alunos, eles me fazem bem e eu sinto que faço o mesmo a eles, antes de tudo como ser humano, e a partir daí, do estabelecimento dessa boa relação, da cooperação entre professor e aluno, é possível produzir resultados efetivos no processo ensino-aprendizagem. Antes de tudo aprendemos com o exemplo, com a prática e daí a fala, a teoria, passa a ter sentido.
É muito simples: se eu quero que meus alunos me deem "bom dia!", lindamente, pela manhã, preciso ser a portadora desse lindo bom dia que eu espero. Se eu quero que sejam gentis comigo, preciso ser a primeira a mostrar como é. Se eu quero que se dediquem com as atividades, trabalhos etc... Preciso ser dedicada como professora, preciso ao menos tentar pensar naquilo que eu posso fazer de agradável nos meus planejamentos, para esperar uma resposta proporcionalmente feliz! Se eu fizer tudo que puder na minha vida usando Ctrl+C Ctrl+V, estou longe de ser um exemplo pra qualquer criança ou adolescente que está na escola, muito pelo contrário, sou mais um corrupto que provavelmente reclama da corrupção do país, estando cego para o erro que está em mim mesmo.
Uma das maiores lições que aprendi na escola pública, é que se você não gosta de gente, se não está aberto a reconhecer e valorizar os outros, o que eles sabem e são, independente de qualquer coisa, antes de buscar isso para si mesmo, esse não é um lugar para você. A escola pública é um lugar de gente que entende de humildade e respeito, que não se deixa levar por pré-conceitos, mas que está aberto ao diálogo, à interação e à empatia. Escola não é lugar de gente preguiçoso, acomodado, que não se preocupa em identificar-se com o outro, conhecê-lo, percebê-lo, entendendo as modificações sociais. Para promover transformação e provocar efeitos duradouros, a escola precisa de gente disposta a buscar alternativas de encantar sua clientela e provocar a vontade de se esforçar um pouquinho mais, aprender um pouquinho mais...
Sem relacionamento, sem cooperação, sem bom humor, não há aprendizagem que ultrapasse as folhinhas de provas... A aprendizagem que marca para a vida, precisa ser provocada por mais do que "conteúdos curriculares difíceis" que ninguém vai usar depois da escola, a aprendizagem que marca para a vida tem a formação crítico-cidadã em primeiro lugar, tem a promoção da habilidade de ler e produzir sentido para a vida, para aquilo que é real e diário como prioridade, tem a escrita como arma social para a promoção de um futuro acadêmico, profissional e cidadão de qualidade.
Não sei se todas as minhas reflexões fazem sentido para outros docentes, mas sei que é o que tem dado certo para mim. Apesar dos resultados da minha escola não serem os melhores, devagarzinho, consigo ver pequenas vitórias como fruto de um trabalho assim, que compensam e me motivam a continuar batalhando, pensando e planejando caminhos para aperfeiçoamento da minha realidade escolar.

2 comentários:

  1. Obviamente esse texto é mais um dos seus "incríveis". Sua forma de trabalhar é maravilhosa, e sua fé é linda.
    Desejo ao mundo mais professores e pessoas como você. Alegra-me tê-la conhecido, e tido como professora. Ainda tenho. E quero sempre te-la como educadora e amiga.
    Lindas e sabias palavras! ♡ Parabéns pela motivação, para você a profissão não perdeu a essência.
    Ser professor é mais que profissão, é vida. Ou melhor, os degrais para o sucesso.
    Você é o degrau para seu próprio sucesso.

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    1. Dá gosto ler o seu panegírico. Você escreve lindamente! Que orgulho! Obviamente, não é por minha causa, mas também é um privilégio para mim ter uma aluna como você!! Obrigada!

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